Era um desses modelos de mulher convencional . Vivia para o lar e a família . Não frequentou escola , casara cedo e , desde então , dedicara-se a manutenção de uma existência mesquinha . Adorava novelas no tempo ocioso , quando não se ocupava com afazeres domésticos . O marido proletariado passava o dia fora , as crianças estudavam em tempo integral e ela arrumava , lavava , passava , cozia e via TV . Desejava intimamente ser como aquelas mulheres que admirava na tela , com seus companheiros prestativos e filhos igualmente atenciosos . Quis fingir o padrão desejado , tentou imitar , ser a amiga dos filhos , a amante do homem , inútil . Todos viviam na rua e só paravam em casa na hora do jantar . Uma noite perguntou sutilmente ao 'amado' como fora o dia de trabalho , ele disse qualquer coisa , com indiferença , e resmungara sobre a comida , a julgar pelo seu desafeto e constantes ausências em casa , suspeitava da existência perturbadora de uma amante . Recorria então , encarecidamente , à atenção filial e era igualmente tratada com descaso - os filhos são todos iguais , pensam que têm o rei na barriga , sempre reclamando dos estudos , supervalorizando a rua , encantando-se com o exterior - pobre mulher , retrato de Amélia injustiçada .
Com a expansão do abismo , dopou-se das mais diversas alienações televisivas . Até que uma noite assassinou , a golpes de faca , o marido e a prole , enterrando-os posteriormente no quintal de casa . Daí em diante foi obrigada a conviver com o silêncio humano permante e agora só assiste aos programas policiais .
Com a expansão do abismo , dopou-se das mais diversas alienações televisivas . Até que uma noite assassinou , a golpes de faca , o marido e a prole , enterrando-os posteriormente no quintal de casa . Daí em diante foi obrigada a conviver com o silêncio humano permante e agora só assiste aos programas policiais .
Tragédia cotidiana que reflete uma realidade cruel e escrava. As insignificantes existências dos que se submetem a imposição dicotômica dos gêneros.
ResponderExcluirGostei do texto Lorene, me fez recordar os contos de Ligia Fagundes Telles, Clarice Lispector... coisas do tipo. Claro, sem comparações diretas e sem exageros literários inúteis.
dever ou ser? com ênfase no dever.
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